quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Pés, unhas e outras "tonterias"

Olho desconsolada para os meus pés.
No último mês, precisamente aquele que pede sandálias giras a ostentar uns pés arranjadinhos, vi-me confrontada com a inevitabilidade. Horas e horas a correr, o "bate-ponta-do-pé" na biqueira do sapato, a humidade porque adoro meter-me dentro de água... esta mistura explosiva resultaria nos pés mais feios do planeta... que, até há momentos atrás, se esconderam d...
entro de sapatos fechados.
Estou farta e decido fazer qualquer coisa por eles. Nem que fiquem meio pintados e meio por pintar - quando não há unha para pintar, torna-se difícil pintar o dedo!
Mas não vim aqui para falar de pedicure. Mas foi "ela", a pedicure, que fez com que tivesse vontade de escrever qualquer coisa sobre um assunto chamado "100 milhas". Naturalmente que tive que me justificar junto da senhora por me apresentar com os pés naquele estado. Unhas negras, quando as há. Ou a inexistência delas. Disse-lhe que corria. Corria bastante. "No outro dia até corri 43 km na areia. Calçada, descalça, sabe lá o que aquilo foi!", disse-lhe eu. Esta justificação mataria o assunto. "Mas porquê?", perguntou simplesmente. Sorri.
Curiosamente, ontem à noite, ouvindo-me falar do assunto, a Inês fez-me a mesma pergunta. "Mamã, vais correr 166 km?", perguntou. Houve até uma ligeira atrapalhação na pronunciação do número, para o que dei uma ajudinha. "Vou tentar, Inês", respondi. "Porquê, mamã?", voltou a perguntar a Inês. Sorri e encolhi os ombros. "Para te dar um abraço no fim e para imaginar, durante aquelas duas voltas de 83 km, que desenho me terás feito quando chegar a casa", pensei para comigo.
E assim foi. Não sei bem porquê, há cerca de um mês, dei comigo a olhar para La Ultima Frontera. Tinha acabado de ser anunciada a nova versão do UTAX, com os seus 88 km e 10.000 metros de desnível acumulado. Foi das primeiras provas de montanha que fiz, há um ano atrás, e contava lá voltar este ano para a distância maior. Mas uma prova com estas características não me permitiria correr, apenas andar, andar, andar. Voltei-me para Espanha. Adoro Espanha, adoro os espanhóis, adoro a língua, adoro a gastronomia e, sobretudo, adoro a forma positiva com que encaram a vida. "Se me diverti tanto na Maratona de Sevilha, La Ultima Frontera não poderá ser diferente", interiorizei.
Cem milhas, os 4 pontos para o UTMB que faltam ou simplesmente... porque sim! Um pouco de tudo. Mas sobretudo "porque sim". Porque efetivamente ainda não sei bem porquê, mas espero encontrar a resposta.
Não podia ir sozinha. Desafiei a Carla. Talvez ainda não estivesse absolutamente convencida e por isso precisava de alguém que, assim que aceitasse o desafio, deitaria "mãos-à-obra" para lá chegar. Alguém que sorri a cada km que passa. Não sei se terei pedalada para as pernas da Carla e não a quero atrasar. Basta saber que lá está, uns minutos à frente, umas horas à frente, uns metros à frente ou uns kms à frente. Obrigada, Carla!
Há duas semanas partilhei a decisão com os meus pais. 37 anos depois continuo a partilhar decisões que me são importantes. Até porque prevejo estar 30 horas sem os contactar. O meu pai olhou-me apreensivo, mas garanti-lhe que eram muito mais perigosos os voos invertidos e os loopings que fazia com a minha idade. Assunto arrumado.
Na minha inexperiência e juventude na corrida, irei preparar-me o melhor que souber e vou contar os dias até 19 de outubro. Porquê não sei. Porque gosto, porque me faz bem, porque gosto de cascalho, pedras e folhinhas, porque tenho muito em que pensar... porque sim!
A caravana lusa vai partir rumo a La Ultima Frontera e oxalá leve muitos índios e cowboys!