Depois de uma semana de férias bem molhada, estou de regresso.
Apesar de encharcada, o balanço é seguramente positivo. Estive com a família, retemperei energias, corri quando pude e… li! Li muito. Algo que infelizmente tenho descurado na minha rotina diária e que devo imperativamente voltar a implementar de forma disciplinada. Tal como a corrida!
Leituras, sonhos e loucuras
Nestas férias o tema mais procurado nas minhas pesquisas foi a corrida e tudo o que lhe está associado. Li várias dezenas de artigos, mas um deles ficou a marinar no meu subconsciente.
“Extreme distance running: too much of a good thing?”. Assim que li este título, viajei até outubro de 2012 e à 3.ª série do AX Trail na Serra da Lousã. Recordei o momento em que subia uma “parede”, lado-a-lado com a Ana Guimarães, irmã do José Guimarães. Naquele dia, eu e a Ana corríamos (quando podíamos) os 30 km da versão mais curta da prova, enquanto o Zé e outros valentes galgavam a mesma serra por uns longos 82 km. “Onde vai o teu irmão buscar forças para os 82? E, acima de tudo, porque o faz?”, recordo-me de lhe perguntar enquanto subíamos serra acima.
Entretanto já vários meses passaram e verifiquei que esta história das ultra-distâncias ou distâncias extremas é mais comum do que pensava. Há várias centenas de “absolutamente locos que corren” por aí! E nem falo dos profissionais das ultras. Falo de gente comum, que trabalha e treina fora de horas para, de quando em vez, se aventurar nuns modestos 100 ou mais km. Conheço um grupo de gente maravilhosa que vai em breve estrear-se nos 101 de Ronda. Não fazem outra coisa senão correr. E correm, correm. No dia seguinte correm também. E até correm duas vezes ao dia! Não se cansam?!
Tudo, nada ou um pedacinho?
Diz-nos a sabedoria popular que a moderação é a chave do sucesso para tudo na vida – o que comemos, o que dormimos, o que trabalhamos. A moderação deve ser o nosso “mantra”.
Nos anos mais recentes este “mantra” ter-se-á estendido ao exercício físico. Os cientistas de laboratório dizem-nos que devemos exercitar o nosso corpo apenas algumas horas por semana para combater doenças cardiovasculares ou prevenir o cancro e viver melhor. Vários investigadores dizem que 15 a 20 km de corridinhas por semana podem acrescentar anos às nossas vidas.
Mas digam lá isto às centenas, milhares e dezenas de milhar de corredores para quem 20 km numa semana não são mais do que um passeio no parque. Para estes corredores não se trata de uma coisa que tenham de fazer. Trata-se de… Ser o que são!
Esta estirpe considera que não há nada mais natural do que correr 150 km por semana. Se necessário for, e porque o dia é limitado, correm de casa para o trabalho e do trabalho para casa. Atendem o telefone enquanto correm para resolver o problema de um cliente ou o desabafo de um amigo.
É possível que o exercício em excesso possa eliminar os benefícios que se retirariam do exercício em doses moderadas. É possível também que quilometragem a mais conduza mais rapidamente ao aparecimento de lesões, caso não haja uma preparação adequada. Há quem diga que os desportos de “endurance” impõem muito stress ao nosso organismo. Outros contrapõem dizendo que o “hardware” do corpo humano está geneticamente preparado para ser testado até aos limites.
Em boa verdade, as vozes na corrida não são diferentes das que se insurgiram contra o azeite há uns anos atrás, vangloriando o óleo alimentar. Depois voltou tudo atrás. Mais tarde a manteiga versus a margarina. E, afinal, haviam-se enganado outra vez!
A curva em “U”
De toda a forma, a curva em forma de “U” é geralmente aceite pela comunidade científica, indicando que, quanto maior o esforço, maior o benefício que retiramos da corrida, mas apenas até um determinado ponto. Depois desse ponto, os benefícios deixam de existir, sugerindo que existe um nível máximo de exercício até se tornar “não-saudável”. Isto significa que alguém que corre 40 km por semana pode efetivamente ser mais saudável do que um corredor que corre 100 km no mesmo período.
Uma coisa é certa. Se todos estão de acordo quanto à curva em forma de “U”, poucos conseguem concluir qual é efetivamente o nível máximo de exercício que constitui esse ponto de viragem. Qual o teto que nos faz mal. Dizem inclusivamente que assumindo que existe um nível de segurança, ele estará provavelmente fora do alcance da maioria dos atletas. Boas notícias, então!
Corre até onde te leva o coração!
Resumindo e baralhando. Não sou cientista, é certo. Mas acredito verdadeiramente que se correr 10 km é bom, correr dez vezes a distância nos trará 10 vezes o prazer, a satisfação, o orgulho. “Puxa, eu consigo tudo isto? Então faço qualquer coisa!”, devem pensar. Eu pensei desta forma quando terminei a minha primeira maratona. Foi o limite estabelecido na altura. E, passo a passo, se vão construindo novos limites e objetivos. E é tão válido o objetivo de completar 5 km para quem se está iniciar na corrida, quanto concluir os 240 km da Marathon des Sables para o Carlos Sá e a Analice Silva!
Como diria uma outra Susana, a Susanna Tamaro, e fazendo a devida adaptação “corre até onde te leva o coração”! O coração leva-nos sempre a lugares maravilhosos.
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