A corrida trouxe benefícios inequívocos à minha vida.
Comecei no asfalto e cedo procurei outros lugares. A
montanha. A montanha é a minha praia.
A participação ativa em treinos ou provas desniveladas
sobre pedras, cascalho e folhinhas, ainda que em modo lento, tem-me permitido
também observar os comportamentos típicos de quem, como eu, é apaixonado pela
modalidade e a forma como vive os quilómetros percorridos.
Volvidos mais de 12 meses de experiências com montes e
vales, não poderia deixar de fazer as devidas adaptações a um texto que redigi há
um ano, quando escrevi umas palavrinhas sobre os viciados na corrida.
Seguem então os sintomas para que possam antecipadamente
precaver-se ou, em alternativa, entregar-se a esta loucura que só nos faz bem.
Um viciado na montanha…
… pensa em desnível acumulado quando
atravessa lombas na estrada;
… sorri quando, no meio da AE, avista um monte ao
fundo e consegue visualizar um “pontinho” que imagina ser ele próprio;
… imagina-se nos percursos montanhosos do Ultra
Trail do Monte Branco, quando sentado no banco do carro aguardando que o semáforo fique verde;
… ouve Ludovico Einaudi enquanto trabalha e sente os
pés a mexer em busca de piso irregular;
… junta-se a outros loucos por montanha à volta do PC
ou da TV a ver filmes inspiradores da Salomon Trail Running TV;
… não se envergonha de começar a caminhar 500 metros depois
de ter iniciado a corrida num treino numa qualquer serra, pois sabe que vai precisar
das pernas mais adiante;
… partilha no Facebook todas as citações inspiradoras que
encontra sobre montes e vales;
… substitui todos os ídolos da adolescência pela Frosty,
Emelie, Kilian e outros campeões da montanha;
… acredita que conseguirá chegar ao topo da montanha
mais rapidamente se usar o equipamento da Anna Frost ou do Kilian;
… pensa que a culpa de não correr mais rápido é do “buff”,
ao qual falta aerodinamismo;
… sempre que vê alguém ultrapassá-lo e correr montanha
acima mais depressa, assume de imediato que o outro correrá uma menor distância e pensa para consigo "vai, vai, que eu já te apanho";
... nas provas, motiva-se a cada quilómetro com tudo aquilo que vê, acredita que mais à frente será ainda mais bonito e consulta a altimetria com indicação dos postos de abastecimento, sonhando com um mero copo de coca-cola fresca;
… vive em estado de ansiedade até que chegue domingo,
dia típico para realização de provas, sabendo de antemão que nunca subirá ao
pódio e muito dificilmente alcançará a primeira metade da classificação geral;
... na véspera das provas, prepara com entusiasmo os camel back com tudo o que vai necessitar
e também o que pensa que nunca necessitará;
… não hesita também em programar o despertador para as
4 AM de domingo, por forma a chegar à prova – na montanha, claro - por que
esperou toda a semana;
… sabe parar quando chega o topo da montanha, não para
“que o mundo o possa ver, mas sim para que possa ver o mundo”;
… define o local das férias anuais em função do número
de montezinhos, serras ou montanhas que o destino oferece e onde possa correr;
… inicia qualquer conversa com um desconhecido com um
desbloqueador de conversa do tipo “por onde anda agora o nosso Presidente da
República”, rapidamente substituído pelo tema “montanha” e a forma como esta
lhe salvou a vida (e deixou de pensar no Presidente da República);
… anuncia no Facebook que vai para a montanha;
… anuncia no Facebook, no mínimo 8 horas depois, que
já chegou da montanha;
… anuncia no Facebook a distância que correu na
montanha, a velocidade a que o fez e quantas calorias queimou;
… partilha no Facebook dezenas de parágrafos
relatando a última prova de 40 km, não esquecendo nenhum detalhe: frio ou
calor, vento ou ameno, as tostas com mel e as minis dos abastecimentos, a dor
no joelho, a queda na pedra escorregadiça, o entorse do tornozelo direito, a
camaradagem entre atletas, os bichos estranhos que viu, os sons que ouviu, as gargalhadas que deu e as paisagens que o fizeram sonhar.
Se nos faz sonhar, que sonhemos pois então!
Muitos parabéns pelo excelente texto. Partilho de (quase, quase) tudo!
ResponderEliminarBoas corridas em Montanha!
Agradeço e retribuo os votos de belíssimas corridas na montanha!
EliminarVemo-nos num trilho por aí!
uma descrição PERFEITA!
ResponderEliminarMuito obrigada, Angelo.
EliminarVemo-nos num trilho por aí!
Palavras para quê? Melhor, só mesmo com Einaudi!
ResponderEliminarEscrever e correr ao som de Einaudi! Haverá lá coisa melhor! ;-)
Eliminar:)
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